sábado, 13 de fevereiro de 2010

Da arte de quebrar Ovos

A Ave sai do Ovo com majestade, suas asas se expandindo por todo o espaço ao redor, porque sua liberdade o universo concreto não pode conter. Ele ergue a visão profunda e o bico se abre para uma primeira lufada de ar. O Pássaro se dissolve em si mesmo e o mundo se dissolve nele, porque o mundo não consegue conter a ideia de pássaro e então ele é diluído na imensidão da liberdade da Ave infinita.


Ele estende uma pata e pisa sobre a casca branca. Ela quebra com facilidade. A realidade concreta é tão frágil quanto uma casca de ovo, e então ele leva o outro limbo para fora do Ovo e quebra sua estrutura imortal, atemporal e quebradiça. O Ovo fica lá, estendido, enquanto o Pássaro não precisa nem levantar voo — ele é o voo, o ar.

Quando o Pássaro se liberta do Ovo, tudo é arte. O Pássaro se dilui nos sentidos dos seres que sentem e nas mentes dos seres que pensam. O Pássaro nos lembra do Ovo, mas o Ovo através do Pássaro é infinitamente mais belo. O Ovo não é goro, o Ovo não é feio, o Ovo não é imoral.

O problema do Ovo é o de ser a prisão do Pássaro. Quando vemos o Ovo, ficamos no Ovo. Quando vemos o Pássaro, voamos com ele.

O Pássaro nem existe. O Pássaro a gente só dilui. O Pássaro dilui-se em nossos corpos e universos e quando vemos ele já está botando Ovos em nossas línguas, mas os Pássaros desses Ovos saberão que, para nascer, hão de se destruir. Hão de renascer, hão de se quebrar para se libertar em um esplendor de luzes-tudo e palavras-pássaro.

Podemos ver que a arte está no Pássaro. Arte, arte mesmo, é quebrar Ovos.
 
Assassinado por Vagabundo.

2 comentários:

Tangerina disse...

O que o Demian não faz com as pessoas...

Hide and Seek disse...

Demian + Símbolo Perdido + Clarice Lispector + Abstratismo.